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Abaixo-assinado MANIFESTO DA COMUNIDADE ACADÊMICA PELA REVISÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Para: V. Ex.a Presidenta da República Federativa do Brasil Dilma Rousseff, Ministro da Educação, Ministra dos Direitos Humanos, Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores brasileiros.

MANIFESTO DA COMUNIDADE ACADÊMICA PELA REVISÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA

A educação de crianças e jovens com necessidades educacionais especiais no Brasil foi institucionalizada no sistema educacional público a partir da década de 1970 e desde então tem havido um movimento contínuo envolvendo essas pessoas, suas famílias, políticos, pesquisadores, profissionais e organizações, no sentido de garantir cada vez mais o direito à educação a essas pessoas.
Ao longo dos 40 anos dessa história, muito embora os caminhos traçados nem sempre tenham sido consensuais, pode-se observar importantes avanços, particularmente a partir de 2003 com mudanças no âmbito da legislação e no financiamento. Apesar disso, constata-se que a construção da política educacional para essa parcela da população, a partir de então, tem sido um empreendimento cada vez menos conduzido de forma coletiva e democrática, produzindo resultados que muito têm preocupado à comunidade acadêmica no país.
A princípio deixamos clara nossa posição a favor do princípio e da política de educação inclusiva, pois consideramos imperativo moral para o país os valores de igualdade e respeito à diferença. Adicionalmente, consideramos ser esta a estratégia ideal no contexto brasileiro para permitir a universalização do acesso à educação para essa população, que vem sendo continuamente marginalizada de nossas escolas. Assim, reafirmamos não haver divergências ideológicas entre o posicionamento da comunidade acadêmica que aqui se manifesta, e a política educacional do MEC, sendo que o presente questionamento se deve exclusivamente à maneira como esta política vem sendo operacionalizada e aos resultados alcançados.
Elencamos a seguir alguns dos problemas que nossos estudos têm evidenciado em relação à política educacional nacional de escolarização de crianças e jovens com deficiências, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação em classes comuns das escolas regulares:
1) Na gestão política do atual governo, a SEESP/MEC ignorando o aporte que se teve no país com o debate acerca da inclusão escolar na última metade da década de 1990, e desafiando o pressuposto de que uma política tenha que ser um processo de construção coletiva, tem tentado consistentemente impingir aos sistemas uma diretriz política não consensual, fundamentada no princípio da inclusão total, o que tem prejudicado o processo de construção da inclusão escolar na realidade brasileira, entre outros motivos, por que: transformou o debate em embate, produzindo divisão no movimento histórico de luta pelo direito à educação de pessoas com necessidades educacionais especiais, ao invés de promover a articulação entre as ações do poder público e da sociedade civil e, além disso, deslocou o debate de seu cerne, que seria de como melhorar a qualidade da educação brasileira para todos os alunos indistintamente, e não sobre onde os alunos com necessidades educacionais especiais deverão estudar.

2) A literatura internacional aponta que a proporção 2% a 20% da população escolar teria necessidades educacionais especiais (NEEs), sendo esta variação dependente do conceito de NEEs adotado. A parcela é mais restrita quando a definição é exclusivamente baseada em critérios médicos, e mais ampla, quando adotados critérios essencialmente educacionais. No caso do Brasil, a definição tem privilegiado critérios educacionais, e considerando que o Censo Escolar de 2010 apontou que o Brasil tem 51,5 milhões de estudantes matriculados na educação básica (pública e privada) podemos estimar haver entre 5 a 10 milhões de crianças e jovens em idade escolar com NEEs. Entretanto, em 2010, o INEP/MEC verificou apenas cerca de 700 mil matrículas nos diferentes níveis de ensino na educação especial. Portanto, a significativa maioria desses alunos ou encontra-se fora de qualquer tipo de escola, ou então não tem sido identificada pelos sistemas educacionais.

3) Segundo as estatísticas oficiais do censo escolar, o número de matrícula de alunos com NEEs, em 2007, era de 654.606, em 2008, de 695.699, em 2009, de 639.718, e, em 2010, de 702.603. O que significa tais oscilações de matriculas que variaram entre +41.093 a -55.981 de um ano para o outro? Tais dados de matrículas têm sido pouco confiáveis, pois carecem de definições e diretrizes políticas mais precisas para identificar alunos com NEEs no país. Exceto nos casos de algumas condições das deficiências, cuja identificação é baseada em critérios objetivos (como por exemplo, nas deficiências visual, auditiva, física, múltipla e surdocegueira), nos demais casos (deficiência intelectual, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação), a identificação tem sido arbitrária e subjetiva. Consequentemente, no âmbito dos sistemas estaduais e municipais isso tem comprometido indicadores para avaliar a política, pois os dados não são confiáveis dado que crianças, vítimas da baixa qualidade da educação oferecida na escola pública brasileira, são identificadas arbitrariamente por seus professores como estudantes com “deficiência intelectual”. Além disso, tais variações sinalizam mudanças nos critérios de identificação, a partir da aprovação do Decreto nº 6.571 (BRASIL, 2008) que garantiu possibilidade de financiamento dobrado para esses alunos, o que evidencia que os critérios de identificação têm sido arbitrários, parecendo flutuar ao sabor das conveniências políticas e financeiras dos poderes públicos.

4) Os documentos do Ministério da Educação/MEC são omissos quanto à exigência do planejamento educacional individualizado, documento formal que deveria descrever o programa educacional em termos de serviços demandados por um estudante em particular, tendo como base a avaliação dos aspectos desenvolvidos do estudante e de suas necessidades especiais a serem ainda atendidas; que registre as adequações individualizadas necessárias para apoiar o estudante a alcançar expectativas de aprendizagem; que identifique como essas expectativas de aprendizagem podem ser alteradas levando-se em consideração as necessidades de aprendizagem do estudante, o currículo padrão e a definição de metas alternativas nas áreas de programas; que permita identificar o repertório de partida, acompanhar a evolução em direção às metas e traçar novos caminhos se determinado programa não estiver permitindo atingir as metas estabelecidas para o estudante; e que enfim permite prestar contas ao aluno, aos seus pais, e a todos que têm responsabilidade para que os objetivos da educação sejam alcançados. Essa omissão exime os sistemas, as escolas e os educadores da responsabilidade pela educação dessas crianças e jovens.
5) Em 2010 foram registradas cerca de 70 mil matrículas de estudantes com NEEs na Educação Infantil, contra aproximadamente 523 mil matrículas no ensino fundamental (74% do total das matrículas). Tais dados indicam que apenas cerca de 13% da população que chega ao ensino fundamental está tendo acesso à educação infantil. O resultado disso é que a maioria significativa das crianças com NEEs somente chega à escola com seis anos de idade, para ingressar no ensino fundamental. Portanto, quando muitas ‘janelas’ de possibilidades de desenvolvimento se fecharam, deixando nas crianças e jovens déficits difíceis de serem superados. Além do pouco acesso à educação infantil as estatísticas do censo escolar indicam que o número de matrículas neste nível de ensino vem diminuído gradativamente nos últimos três anos, caindo de 83.247 em 2008, para 74.779 em 2009 e 69.441 em 2010, perfazendo uma diminuição de cerca de 15 mil matrículas de estudantes com NEEs nos últimos três anos. Cumpre ressaltar que no caso específico das crianças que nascem ou que desde cedo apresentam necessidades educacionais especiais, há muito tempo é reconhecida a importância de um processo educacional formal, chamado de intervenção precoce, porque as crianças com dificuldades diferem de algum modo das crianças com desenvolvimento normal. Tais diferenças criam uma demanda por serviços que vão além do que normalmente se encontra disponível à maioria das crianças e, em maior ou menor grau, elas necessitam de ensino especial, tratamentos terapêuticos, equipamentos especiais ou ambientes estimuladores, que são diferentes daqueles necessários às crianças com desenvolvimento normal. Assim, ainda que houvesse acesso amplo a programas de educação infantil regulares, o que não é efetivamente o caso, eles não seriam suficientes, pois crianças com NEEs precisam de programas de intervenção precoce, que ainda são raros na realidade brasileira.
6) A opção política da SEESP/MEC tem sido a de priorizar a chamada “sala de recurso multifuncional” com serviço de apoio à escolarização de crianças e jovens com NEEs em classe comum. Tal opção, entretanto, representa uma simplificação dos serviços de apoio que não encontra sustentação na literatura da área de inclusão escolar, em termos de efetividade para atender às necessidades diversificadas desses estudantes. Tal sistema apresenta razoáveis desafios à realidade brasileira. Isso porque os professores especializados terão a responsabilidade de responder, em uma ou duas horas de atendimento em turno alternado, às necessidades diferenciadas das mais variadas crianças (com deficiências, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação), que em geral, chegam à escola somente aos seis anos de idade, com atrasos cognitivos, linguisticos e psicomotores consideráveis no desenvolvimento.
7) A política nacional prevê ainda que o atendimento educacional especializado possa ser realizado também em instituições especializadas, e como resultado dessa política tem se observado que a parcela da população de estudantes com maiores prejuízos, que se encontravam nas escolas especiais porque nunca tiveram acesso à escola comum, estão no momento correndo sério risco de serem excluídas do sistema educacional porque as escolas especiais estão sendo estimuladas pelo governo, inclusive financeiramente, a fechar suas escolas especiais com a finalidade de prestar serviços de apoio às crianças com dificuldades escolares encaminhadas pelas escolas comuns. Entre 2007 a 2010 houve, por exemplo, uma diminuição equivalente a cerca de 30 mil matrículas nas provisões consideradas “especiais” (escolas e classes especiais) de estudantes da educação infantil; ao passo que o aumento nas provisões consideradas “inclusivas” para este nível de ensino registrou apenas um acréscimo de nove mil matrículas. Assim, um número considerável de matrículas desapareceu do sistema especializado, sem o contraponto do aumento de matrículas nas classes comuns ou mesmo a garantia de que os estudantes transferidos para as classes comuns estão recebendo suporte do atendimento educacional especializado.
8) As medidas oficiais padronizadas de rendimento escolar coletadas sistematicamente em nosso país nas redes públicas de ensino na última década têm mostrado que o rendimento escolar geral encontra-se abaixo do esperado na série para um amplo contingente de estudantes. Entretanto, a situação é pior no caso dos alunos com NEEs, pois muitos sequer participam dessas avaliações padronizadas. Por outro lado, a distribuição de matrícula observada nos diferentes níveis de ensino permite identificar que de fato há um grande funil do ensino fundamental para o ensino médio, associado a um grande contingente de alunos com NEEs na Educação de Jovens e Adultos. Tais evidências indicam uma falta de avanço desses estudantes no percurso de escolarização e isso tem implicações graves no processo de inserção social futura, comprometendo os objetivos de qualquer política de inclusão escolar.
9) No tocante à formação de professores ressalta-se que no país, associada a uma escassez de oportunidades de formação inicial nos cursos de graduação nas instituições de ensino superior , coexistem programas e projetos pontuais de formação de professores de Educação Especial por parte da Secretaria de Educação Especial (SEESP/MEC), cuja tendência atual tem sido na forma de cursos de curta duração à distância, propostas essas insuficientes para atender às necessidades da área. Em 2006, o censo escolar apontou que havia 54.625 professores especializados no sistema educacional brasileiro e a falta de uma solução definitiva para a questão da formação coloca em xeque a política de inclusão escolar pela ausência de perspectiva sobre onde e como os futuros professores especializados serão formados.
10) A história da Educação Especial brasileira tem mostrado que as alterações de status dado ao órgão responsável pelo equacionamento da educação de crianças e jovens com necessidades educacionais especiais no país tem refletido o grau de prioridade dado a esta questão pelos diferentes governos. O Decreto 72.425, de 3/07/1973, por exemplo, criou o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), junto ao Ministério de Educação. Em 1985 o CENESP foi elevado à condição de Secretaria de Educação Especial (SEESPE), sinalizando uma priorização da educação de crianças e jovens com necessidades educacionais especiais. Em 1990 uma nova reforma administrativa extinguiria a SEESPE, atribuindo à Secretaria Nacional de Educação Básica (SENEB) a responsabilidade de implementar a política de educação especial. Entretanto, neste mesmo ano a Secretaria de Educação Especial (com a nova sigla SEESP) seria restituída, em virtude do reconhecimento da importância deste órgão para garantir o avanço nesta área. Recentemente, o Decreto n.º 7.480 de 16 de maio de 2011 extinguiu novamente a SEESP atribuindo suas funções à Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI). Considerando que os problemas crônicos da educação de crianças e jovens com necessidades educacionais especiais, a comunidade acadêmica questiona se esta medida trará algum benefício para esta parcela da população brasileira, além da possibilidade de contenção de gastos para o atual governo.
11) O Projeto de Lei nº 8035, de 2010, do Poder Executivo, que "aprova o Plano Nacional de Educação para o decênio 2011-2020 e dá outras providências" (PL803510) contém especificamente a Meta IV, com proposições cujas implicações precisam ser melhor analisadas, incluindo a proposta de universalização do atendimento às crianças com NEEs na faixa de escolaridade de 4-17 anos, excluindo de antemão o direito à intervenção precoce dos zero aos três anos e institui a possibilidade da terminalidade do processo educacional; a proposta de educação bilíngue português-libras, com o polêmico entendimento de que a principal língua do aluno surdo é a Língua Portuguesa (oral) e não a Libras; além da falta de previsão de transversalidade da Educação Especial para todos os níveis (principalmente para o Ensino Superior) com as devidas garantias de suportes aos alunos com NEEs, dentre outras.
Enfim consideramos que a ciência será essencial para que a sociedade brasileira busque contribuir, de maneira intencional e planejada, para a superação da educação que tem atuado contrariamente aos ideais de inclusão social e plena cidadania.
O futuro da inclusão escolar em nosso país dependerá de um esforço coletivo, que obrigará à revisão da postura de pesquisadores, políticos, prestadores de serviços, familiares e indivíduos com necessidades educacionais especiais, para trabalhar numa meta comum, que é a de garantir uma educação de melhor qualidade para todos indistintamente. A gravidade do atual momento político demanda um posicionamento da comunidade acadêmica que aqui se expressa, considerando que:
A existência humana não pode ser muda, silenciosa, tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras verdadeiras, com que os homens transformam o mundo... Não é do silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão. (FREIRE, 1987, p.78)




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