Carta Aberta à Novelista Glória Perez

Senhora novelista,
Sua conhecida capacidade de retratar problemas críticos da sociedade contemporânea já lhe valeu muitos prêmios e uma justa fama de pessoa sintonizada com as graves realidades do mundo em que vivemos.
De forma que é de se esperar das suas criações o máximo de aproximação com o mundo real, onde os fatos narrados por v.sa. têm a sua verdadeira dimensão de acontecimentos. Caso contrário, sua proposta de refletir sobre a vida de hoje em dia seria descaracterizada por assumir a dimensão de simples ficção.
Sabendo da sua proposta como novelista, bem como das suas firmes convicções existenciais, modeladas por eventos muito pesados e difíceis ao longo da sua própria vida, queremos ressaltar a importância de contar com atrizes e atores transgêneros para representarem os papéis de pessoas transgêneras que, insistemente, a mídia tem divulgado como sendo parte destacada na sua próxima novela.
Esperamos que a senhora compreenda a importância das lutas que se travam pela afirmação das identidades transgêneras no mundo de hoje e não nos negue a sua consciência e a sua solidariedade de intelectual preocupada com o nosso tempo. As mesmas mídias que falam da sua nova novela, falam na escolha de atrizes cisgêneras para representação de papéis transgêneros, algo que poderia ser até compreensível até meados do século passado, quando era tabu até mesmo falar-se da existência de pessoas gênero-divergentes. Mas não agora, no momento atual, em que, nos EUA, a atriz Laverne Cox brilha e ganha sucessivos prêmios representando uma mulher transgênera na série “Orange is the new black” que a senhora, certamente, deve conhecer.
Não prive a população transgênera de se ver representada fisicamente na sua trama novelística, sempre indutora de grandes e importantes debates sociais. Escolha atrizes e atores transgêneros para representar papéis transgêneros, em vez de fazer como no início do cinema americano, em que atores brancos pintavam a cara para representar papéis de negros.
Contamos com a sua generosidade e com a sua reconhecida sensibilidade para com as atribulações vividas por minorias nesse país.
Cordiais saudações.

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