Petição Pública Brasil Logotipo
Ver Abaixo-Assinado Apoie este Abaixo-Assinado. Assine e divulgue. O seu apoio é muito importante.

Nova Correção da peça prático-profissional de Direito Civil do XIX Exame de Ordem Unificado

Para: Ordem dos Advogados do Brasil


São Paulo, 05 de agosto de 2016






Ao Excelentíssimo Sr. Dr. Claudio Pacheco Prates Lamachia
Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil

Ao Excelentíssimo Sr. Dr. Felipe Sarmento Cordeiro
Secretário-Geral e Presidente da Coordenação Nacional do Exame de Ordem






Referência: Correção da prova prático-profissional de Direito Civil do XIX Exame de Ordem Unificado.


Excelentíssimos Senhores,





Dirijo-me a V. Exas. em razão do Comunicado de 29 de julho de 2016, no qual a Banca Examinadora do XIX Exame de Ordem decidiu manter integralmente o gabarito da peça prático-profissional de Direito Civil publicado no dia 21 de junho de 2016, valendo-se da análise de pareceres de diversos juristas da área.

A elaboração do Comunicado de 29 de julho de 2016 teve como causa principal uma petição pública subscrita, de acordo com a última atualização nesta data, por 1.017 bacharéis de Direito que participaram do XIX Exame de Ordem Unificado. Os candidatos pleiteavam que a Banca Examinadora (Fundação Getúlio Vargas - FGV) desconsiderasse os itens 1 e 2 da Fundamentação Jurídico/Legal do espelho de correção, bem como, o item 3 dos pedidos, atribuindo a respectiva nota a todos examinados na 2ª fase do XIX Exame da OAB.

Ocorre que as conclusões extraídas dos pareceres encomendados não traduzem a melhor interpretação sobre o tema proposto na peça prático-profissional da prova de Direito Civil. Tal fato gerou uma gigantesca sensação de injustiça entre todos os candidatos, tanto naqueles que foram reprovados, com também nos aprovados. Essa sensação não atingiu somente os bacharéis, mas também vários advogados militantes na área e professores que ministram a disciplina de Direito do Consumidor.

O sentimento de injustiça não é infundado. O gabarito da prova, assim como os critérios utilizados para mantê-lo, sintetizados no Comunicado de 29/07/2016, não observaram os limites do Edital do XIX Exame de Ordem Unificado. Além disso, as bases técnicas lançadas nos pareceres não trouxeram as orientações doutrinárias e jurisprudenciais majoritárias sobre o tema, mas tão somente a posição pessoal dos eminentes juristas subscritores. Por fim, mas não menos importante, a própria Banca Examinadora, em provas passadas, utilizou com parâmetro de diversas questões a fundamentação jurídica utilizada pelos Bacharéis que subscrevem a petição pública já mencionada anteriormente.

Estou certo, Presidente Lamachia, que V. Exa. é sensível aos problemas do ensino jurídico no Brasil. Tive a oportunidade de ler um texto, no qual V. Exa. afirmou de maneira brilhante que “há um enorme número de bacharéis, que recebem a venda de um sonho que muitas vezes não é entregue”. Esta frase resume o justo pleito dos Bacharéis que prestaram a 2a. fase de Direito Civil do XIX Exame de Ordem Unificado e foram reprovados em razão da posição adotada pela Banca na correção da peça prático-profissional.

Diante disso, passo a uma análise detalhada dos aspectos que justificam o pleito dos Bacharéis que subscreveram a petição pública para exigir a desconsideração dos itens 1 e 2 da Fundamentação Jurídico/Legal do espelho de correção, bem como, o item 3 dos pedidos, atribuindo a respectiva nota a todos examinados na 2ª fase do XIX Exame da OAB.

I. PRELIMINARMENTE: DA VIOLAÇÃO DOS LIMITES DO EDITAL DO XIX EXAME DE ORDEM UNIFICADO

A Banca Examinadora do XIX Exame de Ordem, por meio do Comunicado de 29 de julho de 2016, decidiu manter integralmente o gabarito da peça prático-profissional de Direito Civil publicado no dia 21 de junho de 2016, valendo-se do conteúdo de pareceres de diversos juristas da área. Todos os pareceres, sem exceção, utilizaram diversos Acórdãos do Superior Tribunal de Justiça para justificar a posição proposta pela Banca Examinadora no espelho de correção.

As análises e conclusões propostas pelos juristas consultados são brilhantes. Todavia, diante do natureza jurídica do Exame de Ordem, não podem ser utilizadas para justificar o gabarito da peça prático-profissional.

É de conhecimento de todos os advogados e bacharéis de Direito que a Ordem dos Advogados do Brasil é uma entidade autônoma, um serviço público independente de categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas. Na ADI 3.026/DF o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento que a OAB não é uma autarquia e não integra a qualquer título a administração indireta da União. Esta autonomia se estende, inclusive, ao Exame de Ordem, cuja legalidade também foi reconhecida pelo Supremo.

Mas esta autonomia que caracteriza a OAB, assim como o Exame de Ordem, não afastam a sua sujeição aos princípios jurídicos aplicáveis à Administração Pública, especialmente o princípio da vinculação ao Edital. A aplicação deste princípio garante a lisura e transparência do Exame, pois é com base no conteúdo indicado no Edital que os Bacharéis desenvolverão todo o seu estudo.

A Banca Examinadora, no Edital de Abertura do XIX Exame de Ordem Unificado, elaborado nos termos do Provimento 144, de 13 de junho de 2011, e suas alterações posteriores constantes no Provimento 156/2013, descreveu no ANEXO II (Conteúdo Programático da Prova Prático-Profissional) quais os conteúdos técnico-jurídicos poderiam ser abordados na prova prático-profissional. Todavia, esses conteúdos devem ser abordados nos limites impostos pelo próprio Edital. Ganha destaque para a nossa análise a redação do item 3.5.12, o qual estabelece que:

3.5.12. As questões da prova prático-profissional poderão ser formuladas de modo que, necessariamente, a resposta reflita a jurisprudência pacificada dos Tribunais Superiores (grifos meus).


A expressão "jurisprudência pacificada dos tribunais superiores" nos leva, inevitavelmente, a duas conclusões sobre os limites dos conteúdos que podem ser cobrados no Exame de Ordem:

a- A Banca Examinado não pode cobrar dos candidatos temas controvertidos na jurisprudência do STJ e do STF.

b- A ideia de "jurisprudência consolidada" deve limitar-se aos entendimentos consolidados em Súmulas, Súmulas Vinculantes e, também, precedentes sujeitos ao rito de recursos repetitivos ou repercussão geral.

Ocorre que a Banca Examinadora do XIX na peça prático-profissional não observou os limites impostos no item 3.5.12 do Edital de Abertura. A fundamentação jurídica apresentada nos pareceres elaborados pelos juristas para justificar a manutenção dos critérios de correção dos itens 1 e 2 da Fundamentação Jurídico/Legal e do item 3 dos pedidos, tomaram como base Acórdãos que não retratam a jurisprudência consolidada do tribunais superiores. Além disso, o teor dos Acórdãos não são aplicáveis ao problema proposto na peça prática-profissional. Passemos a uma análise isolada de cada um deles.

1) Acórdãos do Superior Tribunal de Justiça

1.1. Recurso Especial 683.809-RS
(Relator - Ministro Luis Felipe Salomão)

O Acórdão versa sobre uma ação indenizatória proposta por Helenyr Gudes de Albuquerque em face Novo Hamburgo Companhia de Seguros S/A e Companhia Geral de Acessórios - CGA.

O caso envolve o ressarcimento de danos materiais e morais pela má prestação de serviços da Companhia Geral de Acessórios - CGA, uma concessória de serviços automotivos credenciada da ré Novo Hamburgo Companhia de Seguros S/A, no veículo de propriedade da autora. Sem mais esforços, é fácil é perceber que o objeto do litígio deste Acórdão não possui qualquer relação com o problema da peça prático-profissional, pois trata de uma problema de vício de serviço e não acidente de consumo.

1.2. Recurso Especial 1.165.279-SP
(Relator - Ministro Paulo de Tarso Sanseverino)

O Acórdão cuida de uma ação indenizatória proposta por Daniel Rodrigues Ângelo Herculândia EPP contra a Empresa Brasileira de Telecomunicações (Embratel) e a Brasil Telecom. Acórdão discute a possibilidade de denunciação da lide, tendo em vista a regra do art. 88 do CDC. Este julgado, assim como o anterior, não versa sobre a questão proposta na peça prático-profissional. Vale a pena destacar, inclusive, que o tema da intervenção de terceiros não foi objeto de discussão em nenhum dos itens propostos pela banca examinadora.

1.3. Recurso Especial 1.316.868 - DF
(Relator - Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva)

O Acórdão tem como origem ação de indenização por danos morais e estéticos proposta por Ana Maria Pereira de Andrade sob o fundamento de falha na prestação de serviço, no caso uma intervenção cirúrgica para diminuição da cavidade gástrica, que contratou com um dos prepostos do hospital Anchieta Ltda.

Trata-se, portanto, de uma discussão envolvendo responsabilidade pelo fato do serviço (art. 14 do CDC). Como é de conhecimento de V. Exas. a questão da prova envolve um acidente cuja causa é um produto (art. 12 do CDC). Neste caso a forma de imputação de responsabilidade é completamente diferente, justamente porque não existe na cadeia econômica dos serviços a figura do "comerciante". O art. 14 do CDC não distingue os responsáveis pelo fato do serviço, ou seja, todos têm responsabilidade direta pelo dano. Já na hipótese do fato do produto existem diferenças na forma de imputação, daí porque o tema é tratado tanto no art. 12 como também no art. 13.

Daí porque, este julgado também não pode servir de base para justificar o critério de correção adotado na prova prático profissional.

1.4. Agravo em Recurso Especial 265.586-SP
(Relator - Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva)

Trata-se de um Acórdão negou seguimento ao Recurso Especial interposto pela Nestlé Brasil S/A. O Ministro Relator, ao justificar a sua posição, cita diversos Acórdãos da Corte que traduzem a jurisprudência sobre o tema. Dos julgados citados, dois deles (EREsp 422.778/SP e o REsp 980.860/SP)
merecem a nossa atenção. Isso porque confirmam a tese apresentada pelos Bacharéis na petição pública e não a tese da Banca Examinadora.

1.5. Recurso Especial 181.580-SP
(Relator - Ministro Castro Filho)

Trata-se de um Acórdão que discute a legitimidade ativa da Procuradoria de assistência judiciária para propor ação civil pública objetivando indenização por danos materiais e morais decorrentes de explosão de estabelecimento que explorava o comércio de fogos de artifício e congêneres. O Julgado cuida, ainda, da caracterização da figura dos consumidores por equiparação na hipótese do art. 17 do CDC. Este tema também não foi objeto de discussão em nenhum dos itens propostos pela banca examinadora na peça prático-profissional. Além disso, a questão do Acórdão envolve um litígio de consumo cujo objeto é um produto perecível, o qual possui um regime jurídico específico de imputação de responsabilidade civil distinto dos acidentes de consumo envolvendo eletroeletrônicos.

2) Acórdãos de Tribunais de Justiça

2.1. Apelação Cível 8903/2005 - Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
(Relator - Desembargador Renato Simoni)

2.2. Apelação Cível nº 0001490-49.2005.8.19.0205 - Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
(Relator - Desembargador Nagib Slaibi)

2.3. Agravo de Instrumento nº 763.026-8 - Tribunal de Justiça do Paraná
(Relator - Desembargador Sérgio Arenhart)

2.4. Apelação Cível com revisão 484.739-4/8-00 - Tribunal de Justiça de São Paulo

A análise do teor destes Acórdãos é totalmente irrelevante. Como já tivemos a oportunidade de esclarecer, o Edital de abertura do XIX Exame de Ordem, claramente, exige dos candidatos apenas a jurisprudência dos Tribunais Superiores. A jurisprudência dos Tribunais Estaduais não faz parte do escopo da prova prático-profissional.

II. ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA FALHA DA FONTE DE ENERGIA DO EQUIPAMENTO

II.1. ASPECTOS GERAIS

A problemática apresentada na peça prático-profissional da área de Direito Civil do XIX Exame de Ordem tinha como ponto central avaliar o correto enquadramento jurídico de uma falha numa fonte de energia elétrica de uma TV de LED com sessenta polegadas adquirida por Antônio Augusto. O componente sofreu um superaquecimento, provocando danos irreparáveis a todos os aparelhos eletrônicos que estavam conectados ao televisor.

Assim, cabia aos candidatos avaliar se a falha na fonte de energia elétrica do televisor era uma hipótese de responsabilidade pelo fato ou pelo vício, tendo em vista a condição de consumidor de Antônio Augusto. A leitura do problema não deixava dúvidas que a falha na fonte de energia elétrica violou simultaneamente dois princípios: a) Princípio da Segurança e b) Princípio da Adequação.

O princípio da segurança foi previsto no caput, no inciso II, alínea ‘’d’’, e também, no inciso IV do art. 4° do CDC. O conceito de segurança adotado pelo CDC não é absoluto. Cabe ao Estado, por meio de órgãos e agências reguladoras, definir os padrões de segurança que devem ser adotados pelos fornecedores (fabricantes, importadores, comerciantes, dentre outros) para permitir a circulação dos produtos no mercado de consumo.

A violação ao princípio da segurança caracteriza o defeito do produto (também tratado como vício de insegurança pela doutrina e jurisprudência) e a hipótese de responsabilidade pelo fato do produto. O art. 8° do CDC determina de maneira expressa que os produtos "não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição". Este dispositivo é complementado pelo § 1° do art. 12, o qual, afirma que o defeito se caracteriza "quando não oferece a segurança que dele legitimamente espera". Diante disso, se evidencia que a segurança deve observar circunstâncias relevantes, dentre as quais, a apresentação, o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam e, também, a época em que foi colocado em circulação.

Assim, da leitura dos arts. 8° e 12 do CDC, podemos concluir que o defeito do produto e, consequentemente, a caracterização da responsabilidade pelo fato é o resultado da violação do princípio da segurança capaz de provocar a exposição do consumidor à riscos na esfera da sua incolumidade físico-psíquica, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, cujas circunstâncias relevantes de análise são a sua apresentação, o uso e riscos que razoavelmente dele se esperam e, também, a época em que foi colocado em circulação.

Ao lado da segurança existe outro dever jurídico, um outro standard de conduta, o qual deve ser observado pelos fornecedores para a inserção de produtos no mercado de consumo. Trata-se do dever de adequação que tem como objetivo assegurar a qualidade dos produtos colocados em circulação no mercado.

A qualidade do produto se expressa com o seu desempenho, noutros termos, com o cumprimento de sua finalidade em acordo com a expectativa legítima do consumidor. Ela também se manifesta por meio da durabilidade, isto é, a garantia de sua utilização (do produto ou do serviço) em um determinado lapso temporal sem que o mesmo perca suas funções essenciais. Por fim, a qualidade impõe a simetria entre a prestação (entrega do produto que o consumidor legitimamente espera) e a contraprestação (valor pago pelo consumidor para adquirir o produto).

A violação do dever de qualidade caracteriza o vício do produto (arts. 18 a 20 do CDC). O vício representa uma ausência de propriedades ou características que inviabilizam ao consumidor atingir os fins legitimamente esperados para a aquisição do bem de consumo.

O vício pode ser definido, fundamentando-se pela a própria redação do art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, da seguinte forma: uma falha de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios, ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes de sua disparidade informacional.

II.2. CONCLUSÃO: A FALHA DO COMPONENTE DO TELEVISOR É UMA HIPÓTESE DE DEFEITO OU VÍCIO?

Para compreender se a falha no componente do televisor adquirido por Antônio Augusto é um defeito (vício de segurança) ou vício de qualidade, é fundamental compreender a função principal deste componente. A fonte de energia elétrica é um componente crítico de segurança.

A falha apresentada no problema trouxe, por si só, um risco inerente à incolumidade físico-psíquica do consumidor, tendo em vista a caracterização da periculosidade adquirida do componente.

Diante desses argumentos, não nos resta alternativa senão afirmar que a única hipótese de caracterização da falha a caracterização na fonte de energia elétrica caracteriza de maneira cristalina uma hipótese de defeito do produto, permitindo o enquadramento da hipótese no regime jurídico da responsabilidade pelo fato do produto, disciplinada nos arts. 12 e 13 do CDC.
III. DA FORMA DE IMPUTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE DO COMERCIANTE: ANÁLISE DOUTRINÁRIA DO PROBLEMA.

A forma de imputação de responsabilidade civil do comerciante na hipótese de responsabilidade pelo fato do produto tem gerado um grande debate na doutrina. Existem àqueles que defendem tratar-se de uma hipótese de responsabilidade subsidiária, outros defendem que o art. 13 permite uma imputação de responsabilidade solidária, mas restrita aos suportes normativos descritos nos incisos do referido artigo.

A posição que defende a imputação subsidiária do comerciante ainda é majoritária na doutrina. Esta corrente tem como argumento inicial a análise proposta por Zelmo Denari, um dos autores do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor, numa das obras mais clássicas do Direito do Consumidor no Brasil. Ele afirma, categoricamente, que

"a responsabilidade do comerciante, nos acidentes de consumo, é meramente subsidiária, pois os obrigados principais são aqueles elencados no art. 12"
(Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto / Ada Pellegrini Grinover...[et al.]. Editora Forense. 2011. p. 207).

A proposta de Zelmo Denari foi seguida por outros importantes doutrinadores brasileiros. Como exemplo, temos a lição de Sergio Cavalieri Filho. Ele argumenta que:

"o comerciante, pelos acidentes de consumo, teve a sua responsabilidade excluída em via principal. O Código, em seu art. 13, atribui-lhe apenas uma responsabilidade subsidiária. (...) Convém ressaltar que a inclusão do comerciante como responsável subsidiário foi para favorecer e reforçar a posição do consumidor, não para enfraquecê-lo. Importa dizer que a inclusão do comerciante não exclui o fornecedor; aumenta a cadeia dos coobrigados, não a diminui"
(Programa de Direito do Consumidor. Atlas. 2011. p. 298).

Na mesma linha de argumentação, ou seja, sustentando a imputação subsidiária do comerciante na hipótese do fato do produto surge também a lição do Ministro do STJ Paulo de Tarso Vieira Sanseverino. Ele afirma que

"o comerciante atacadista ou varejista aparece como responsável aparente quando vender produtos anônimos ou produtos perecíveis em mau estado de conservação. Figura como responsável aparente, sendo somente responsabilizado subsidiariamente, quando não identificar o fabricante ou o importador no produto vendido.

A responsabilidade do comerciante foi substancialmente restringida em confronto com a dos demais fornecedores. A razão é evidente, já que o seu contato com o produto é restrito, limitando-se à exposição deste em seu estabelecimento comercial e ao fornecimento de explicações ao consumidor, as quais lhe foram repassadas pelo próprio fabricante ou importador"
(Responsabilidade civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor. Saraiva. 2007. p. 176).

O Ministro do Superior Tribunal de Justiça Antonio Herman V. Benjamin, na sua obra elaborada em coautoria com Claudia Lima Marques e Leonardo Roscoe Bessa, também defende a subsidiariedade numa abordagem peculiar. Ele afirma que

"no Contexto do Código, a responsabilidade do comerciante é subsidiária, isto é, secundária em relação àquela dos outros agentes econômicos, que é principal. Subsidiariedade esta que vem acrescentar, ao rol primitivo do art. 12, caput, o sujeito faltante: o comerciante. Fecha-se o círculo. Trata-se, portanto, de operação de adição e não de subtração do número de agentes econômicos responsáveis pelos acidentes de consumo"
(Manual de Direito do Consumidor. 2013. p. 174).

Já Leonardo de Medeiros Garcia, em uma posição intermediária, entende que a responsabilidade do comerciante de uma forma peculiar. Ele defende que:

"ela é condicionada a algumas circunstâncias, quais sejam, as hipóteses enumeradas no art. 13. Assim, quando constatadas quaisquer das hipóteses, o comerciante responderia diretamente pelo acidente de consumo causado"
(Direito do Consumidor. Editora Impetus. 2010. p. 134).

Esta também é a posição de Silvio Luís Ferreira da Rocha. Este autor afirma que:

"o "comerciante" é também responsável pelo dever de indenizar o consumidor pelos prejuízos causados por produtos defeituosos por ele comercializados. A responsabilidade do comerciante, entretanto, é especial e eventual, porque ocorrerá apenas se estiverem presentes determinadas hipóteses fáticas previstas no art. 13 do Código de Defesa do Consumidor (...) Assim, além do fabricante, produtor, construtor ou importador, poderá ser responsabilizado o comerciante, presentes as seguintes circunstâncias: a) existência de produto anônimo; b) produto mal-identificado; c) produtos perecíveis mal-conservados"
(Responsabilidade Civil do Fornecedor pelo Fato do Produto no Direito Brasileiro. Editora Revista dos Tribunais. 2000. p. 85).

Mesmo os autores que defendem a solidariedade do comerciante na hipótese do art. 13 do CDC, a exemplo de Rizzatto Nunes, utilizam o argumento que esta solidariedade é restrita ao escopo normativo descrito nos incisos do referido dispositivo. Vale aqui a transcrição do argumento do autor já citado anteriormente:

"O comerciante do art. 13 está submetido ao mesmo sistema de responsabilização que o importador do art. 12. É que o comerciante, ao adquirir produtos para revendê-lo, age - deve agir - com o mesmo critério que o importador ao adquirir produtos do exterior. É verdade que a hipótese do art. 13 traz menos responsabilidade ao comerciante do que a do art. 12 ao importador. Este é responsável, sempre, por todos os produtos adquiridos, com ou sem identificação do fabricante, conserve ou não adequadamente os produtos perecíveis. Aquele - o comerciante - só se responsabiliza por defeito nas hipóteses I, II e III do art. 13, que serão a seguir tratadas".
(Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. Saraiva. 2010. p. 265)

No mesma linha é a posição de Orlando Celso da Silva Neto. Este autor afirma que:

"Pode-se dizer também que, apesar de a responsabilidade do CDC ser objetiva, há uma "prevalência de responsabilidades" (impropriamente falando), segundo a qual no caso de dano causado por defeito do produto prepondera a responsabilidade do fabricante, produtor (importador, como substituto), respondendo o comerciante apenas nas hipóteses do art. 13. É de se ressaltar que não se trata de hipótese de responsabilidade subsidiária, mas sim de responsabilidade solidária restrita a casos específicos".

Tomando como base as diversas posições apresentadas pela doutrina é possível identificar dois pontos comuns. São eles:

1) A imputação de responsabilidade do comerciante na hipótese de fato do produto é peculiar. Este sujeito não se encontra na mesma posição jurídica das pessoas indicadas no art. 12 do CDC.

2) A imputação de responsabilidade do comerciante, subsidiária ou solidária, é restrita às hipóteses descritas nos incisos do art. 13 do CDC.

Feita a análise doutrinária, podemos agora confrontar estas orientações com a posição jurisprudencial sobre o tema.

IV. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL DO ENQUADRAMENTO

Já tivemos a oportunidade de explicar no item I que a temática da peça prático-profissional não possui uma orientação jurisprudencial consolidada. Todos os Acórdãos do STJ apenas tangenciam a questão proposta. Apenas a jurisprudência dos Tribunais Estaduais possuem Acórdãos específicos. Todavia, a análise desses julgados são irrelevantes diante da previsão do item 3.5.12 do Edital de Abertura.

V. O POSICIONAMENTO DA BANCA EXAMINADORA EM OUTRAS PROVAS DA OAB

Muito embora não seja um argumento jurídico que explique ou justifique o gabarito apresentado da peça prático-profissional da prova de Direito Civil do XIX Exame de Ordem Unificado, é importante destacar que a Banca Examinadora, em provas anteriores do Exame de Ordem, reconheceu a responsabilidade subsidiária do comerciante. Tal fato, por si só, explica porque boa parte do candidatos reprovados utilizaram esta tese. Eles, obviamente, se preocuparam em entender o posicionamento da Banca Examinado, conduta naturalmente esperada de qualquer pessoa que pretende ser avaliado numa prova desta magnitude.

VI. CONCLUSÃO: O COMERCIANTE É PARTE LEGÍTIMA PARA FIGURAR NO POLO PASSIVA DA DEMANDA?

No problema formulado no XIX Exame de Ordem Unificado. A questão identifica com clareza o fabricante e o comerciante do televisor que provocou o acidente de consumo. Daí porque o juiz de 1a. instância acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva do comerciante.
Não há a menor dúvida que o magistrado de 1a. instância agiu corretamente. A história não trouxe qualquer elemento fático capaz de enquadrar a problemática em uma das hipóteses dos incisos do art. 13 do DDC. Dessa forma, não caberia ao candidato revolver esta questão em sede recursal. Se assim o fizesse estaria desalinhado com todo a orientação doutrinária sobre o assunto, podendo, ainda, incorrer na violação de normas processuais e éticas. O inciso III do art. 14 do CPC/73, cuja redação é similar ao inciso II do art. 77 do CPC/15, determina que as partes e seus procuradores não podem "formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento". Além disso, discutir a legitimidade do comerciante abriria à parte contrária a possibilidade de argumentar uma eventual litigância de má-fé.
Com isso, é possível concluir que a Banca Examinadora não poderia exigir a inclusão do comerciante no pólo passivo como quesito de avaliação, pois trata-se de orientação em desconformidade com a doutrina majoritária e as regras éticas e processuais vigentes à época da prova.

VII. CONCLUSÕES FINAIS

Diante dos argumentos apresentados, mais uma vez dirijo- a V. Exas. para agora pleitear em nome de todos os bacharéis de Direito que se submeteram à prova prático-profissional de Direito Civil do XIX Exame Unificado da OAB, o reconhecimento da tese apresentada na petição pública dirigida à Banca Examinadora permitindo, assim, uma correção justa e coerente para todos os candidatos que foram reprovados.

Por fim, aproveito o ensejo para renovar meus votos de admiração por V. Exas. na condução do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

Sinceramente,


Brunno Pandori Giancoli
Advogado e Professor de Direito do Consumidor




Qual a sua opinião?

O atual abaixo-assinado encontra-se alojado no site Petição Publica Brasil que disponibiliza um serviço público gratuito para todos os Brasileiros apoiarem as causas em que acreditam e criarem abaixos-assinados online. Caso tenha alguma questão ou sugestão para o autor do Abaixo-Assinado poderá fazê-lo através do seguinte link Contatar Autor
Já Assinaram
1.597 Pessoas

O seu apoio é muito importante. Apoie esta causa. Assine o Abaixo-Assinado.

Outros Abaixo-Assinados que podem interessar