Pelo fim da violência sexual e de gênero
Para: Exmo. Sr. Reitor da Universidade de São Paulo: Prof. Dr. Marco Antonio Zago; Exmo. Sr. Vice-Reitor da Universidade de São Paulo: Prof. Dr. Vahan Agopyan; Exma. Sra. Pró-Reitora de Cultura e Extensão: Profa. Dra. Maria Arminda Nascimento Arruda; Exma. Sra. Coordenadora da ONU Mulheres:Profa. Dra. Eva Blay e Exmos. Srs. Membros do Conselho Universitário
Como professoras e pesquisadoras da Universidade de São Paulo, somos afetadas pelas questões da violência sexual e de gênero de várias formas. Sentimo-nos perplexas e indignadas diante do relatório da CPI da violência nas universidades, que registra a violência nas universidades estaduais paulistas, inclusive na USP; diante da perspectiva de que a Universidade possa formar e diplomar possíveis agressores; diante das demandas de nossas alunas, tanto no sentido da falta de acolhimento para situações de violência por elas vivenciadas, como também em relação à ausência de um posicionamento mais sistemático frente a este desafiador contexto.
Em abril de 2015 constituímos a Rede de Professoras e Pesquisadoras da USP pelo fim da violência sexual e de gênero. O objetivo da Rede é contribuir para o reconhecimento da violência sexual e de gênero como problema importante no contexto da vida universitária, bem como para seu enfrentamento, o que demanda ações de toda a comunidade e efetividade dos mecanismos institucionais.
Lembramos que nossa ação coletiva tem se direcionado para promover ações de educação e sensibilização que favoreçam o reconhecimento e enfrentamento da violência sexual e de gênero; contribuam para o aperfeiçoamento dos regulamentos e mecanismos institucionais que levem à responsabilização dos agressores e à eliminação da violência; estimulem a criação de redes de
solidariedade e a organização das mulheres; e criem espaços de escuta, acolhimento e encaminhamentos para pessoas que sofrem e denunciam violência sexual e de gênero, uma vez que recebemos denúncias e relatos que confirmam ocorrências de violência na Universidade envolvendo alunas e alunos de diferentes Unidades. Nesse sentido, preocupa-nos especialmente os casos de violência no CRUSP. Avaliamos que a situação ali exige atenção extrema, uma vez que é o espaço de moradia de nossos estudantes.
Não temos condições e nem pretendemos sobrepor nossas ações a ações institucionais para o enfrentamento desses problemas. Como mulheres - servidoras públicas, professoras e pesquisadoras - estamos respondendo a um cenário que nos atingiu, mas esperamos da Universidade as medidas para criação de fluxos, espaços e mecanismos que possam solucionar o problema.
Por isso, solicitamos que a Reitoria possa garantir:
- a continuidade e a efetividade de processos já iniciados, como os casos de violência sexual ocorridos na Faculdade de Medicina e na Medicina Veterinária;
- a priorização do enfrentamento dos problemas no CRUSP, de modo que o Conjunto Residencial se torne exemplar de novas abordagens e procedimentos efetivos contra a violência sexual e de gênero no cotidiano universitário;
- a criação de mecanismos e espaços de denúncia, apuração e responsabilização, marcados por cuidado e sigilo;
- a efetivação de ações mais educativas e menos repressoras, dando centralidade às questões de gênero associadas aos contextos de violência.
As situações que envolvem violência são delicadas, matizadas e implicam mudanças na cultura instituída na universidade. Uma cultura que, muitas vezes, naturaliza a violência. Universidades consagradas na América do Norte e na Europa vêm incorporando o enfrentamento dos problemas de violência sexual e de gênero como parte essencial de sua função educacional e cultural. Elas têm divulgado sistematicamente princípios e procedimentos, baseados em conhecimentos produzidos por especialistas, e em processos bottom-up de criação de políticas com a participação de todos os sujeitos envolvidos na questão. Se as universidades são instituições especialmente vulneráveis a expressões de violência sexual e de gênero cabe a elas, como produtoras de conhecimento, gerar políticas exemplares que possam servir de referência para outras instituições e a sociedade democrática em geral.
Temos orientado as jovens que acolhemos para que, caso queiram, busquem os mecanismos institucionais que possam receber e encaminhar as denúncias, bem como o aparato institucional que vise oferecer suporte psicossocial para que consigam lidar com as consequências físicas e emocionais geradas pela violência.
Esperamos que a Universidade de São Paulo responda com competência ao desafio que se apresenta, incorporando dimensões pelas quais a excelência se traduza também em uma vida comunitária e acadêmica marcada por cuidado, proteção, cidadania e direitos humanos.
Rede de professoras e pesquisadoras da USP pelo fim da violência.